28 abril 2006

Rua Mumia Abu Jamal

É um dia histórico no apoio a este prisioneiro político nos EUA, e cidadão honorário de variadíssimas cidades mundiais, incluindo Paris, Veneza, Saint-Denis, etc. O Presidente da Câmara Didier Paillard (o mesmo que tomou a iniciativa do referendo de que falei há dias) é quem tomou a iniciativa e vai presidir amanhã à inauguração.
É uma prenda de aniversário para Mumia, que está preso e condenado à morte há 23 anos.

Versão oficial: porque matou um polícia, facto desmentido pela confissão do assassino, e por várias provas forenses e de balística.
Versão real: porque fez o seu trabalho de jornalista e relatou a violência racista da polícia dos EUA.

Hush!

Yo-Yo Ma é um dos melhores violoncelistas de sempre, dotado também de uma dose razoável de bom humor. Bobby McFerrin tem um aparelho vocal capaz de tudo. Nem lhe posso chamar voz, porque não se trata só disso. Vai muito além.
Este disco Hush é uma maneira destes dois se divertirem à brava e ainda nos convidam para a festa!

Ali ao lado fica a Musette de J. S. Bach (com uma surpresa do Jimmy Hendrix), e depois o Vôo do Moscardo de Rimsky-Korsakov. Atenção, porque tudo o que se ouve é um violoncelo e o Bobby McFerrin. Tudo o que ouvirem que não seja o violoncelo, mesmo que não pareça humano, é! Por alguma razão ele se auto-intitula Robot McFerrin. Impressionante!

May Day contra a precariedade


Esta é uma iniciativa mundial contra a precariedade. Organiza-se em cerca de 20 cidades na Europa e EUA.
E como a organização explica melhor do que eu do que se trata, aqui vai a tradução do essencial.

O que é o May Day?

A May Day parade é a grande manifestação aberta, reivindicativa e festiva de todos os precários. Um momento de auto-organização, de encontros e convergência. O habitual "Dia do Trabalhador" já não é suficiente para dar visibilidade às múltiplas formas de precariedade. Queremos fazer do 1º de Maio uma festa dos precários e trabalhadores dos nossos dias. Em 2006 este momento de visibilidade das lutas dos precários será realizado em cerca de vinte cidades europeias e nos EUA. Estão todos convidados a participar.



Quem somos?

Desempregados, beneficiários do rendimento mínimo, assalariados precários, sem emprego, independentes, free-lancers, subsidiados, doentes, deficientes, sem contrato, estagiários, estudantes, trabalhadores temporários, sem-papéis, trabalhadores/as do sexo, às vezes tudo ao mesmo tempo. Somos precários em luta.


O que queremos?

Ter alojamento, onde dormir, aprender, fundar as famílias que desejamos, produzir e aceder a uma informação e cultura diversificadas, traocar saberes livremente, comer bem, ter cuidados de saúde, criar todas as formas de riqueza, deslocar-nos e instalar-nos livremente, participar na vida das cidades, criar novos espaços públicos e novas formas de viver em sociedade.


Nos vies ne sont pas négociables.


Ora, Portugal tem tantos ou mais problemas de precariedade que a restante União Europeia. Além da precariedade legalizada, existem muitas formas de contornar a legalidade e iludir (ou escapar) a Inspecção do Trabalho. Quantas vezes essa forma não é o simples recurso à ameaça velada de um despedimento, ou pior, de uma denúncia ao SEF... Quantas mulheres tiveram que planear a gravidez de acordo com as conveniências do chefe, ou mesmo pôr essa ideia completamente de lado? Quantos portugueses podem garantir sem dúvidas neste instante que ainda terão emprego no próximo mês? E quantos cumprem apenas o horário previsto no Código de Trabalho, têm as férias previstas legalmente, os ordenados legais e justos, as horas extraordinárias pagas pela tabela... quantos?


Para quando o May Day Lisboa?
As nossas vidas não são negociáveis.

Ei-lo, o livro!

El burlador de Sevilla
y convidado de piedra
Comedia famosa del maestro Tirso de Molina

Esta é mais uma versão da famosíssima e muitas vezes reescrita história de D. Juan Tenorio. Mas desta personagem todos sabemos mais ou menos qualquer coisa. Assim por alto, é um tipo incapaz de obedecer a quaisquer convenções sociais (e não só as de fidelidade), não respeita regras nem pessoas. Depois, cada autor faz a sua versão, e como eu não conheço nem um terço (talvez nem um quarto) dos D. Juans da literatura, fico por aqui.


O me encantou neste livro é o deslumbre com que vêm a cidade (espanhola na época) de Lisboa. O texto é de cerca de 1630 (talvez um pouco antes) e nele convivem várias personagens e acontecimentos de épocas diferentes. A páginas tantas o Rei de Castela manda um nobre a Lisboa. Claro que quando Lisboa pertenceu a Espanha, já esta estava unificada e o Rei seria de Espanha e não de Castela... E que notícias traz D. Gonzalo de Lisboa?

"La mayor ciudad de España (...) Es Lisboa una otava maravilla."

Descreve o percurso do Tejo entre duas serras (Sintra e Arrábida), e ainda o que parece outra cidade sobre o rio, tal o número de embarcações que ali estão. Este monólogo de D. Gonzalo é um hino de amor a Lisboa e à sua magnificência.
Os Jerónimos, o Rossio, a Rua Nova dos Mercadores e a riqueza destes, o Terreiro do Paço e o Paço, "edifício de Ulisses", assim como a variedade, abundância e riqueza das comidas, e a neve da Serra da Estrela...

"Mas, ¿qué me canso?
porque es contar las estrellas
querer contar una parte
de la ciudad opulenta."

"Mas, para que me canso? Porque é como contar as estrelas, querer contar uma parte da cidade opulenta."

Um bom português é um português morto!

Diz o PM Sócrates, e já dizia há mais tempo o PR Cavaco. E, parece-me, a ver pelas votações que estes dois senhores tiveram, diz a grande maioria dos portugueses.

«(...) o crescimento das despesas com pensões é o que mais seriamente questiona a sustentabilidade do modelo social (...) E é sabido que ele deriva, fundamentalmente, do aumento da esperança média de vida», diz Sócrates.
Há anos, Cavaco explicava que um trabalhador é um custo insustentável porque recebe salário. Um reformado é pior, porque recebe pensão e nem sequer produz. Dizia ele que "resta-nos esperar que (o trabalhador) morra". Especialmente se fôr o bode expiatório de toda a crise: o funcionário público.

Claro que ninguém explica que Portugal é dos países europeus com menor peso da função pública no total da população activa, ou que precisamos de mais funcionários nos serviços públicos (que toda a gente diz que são lentos, porque falta pessoal, mas depois também dizem que há demasiados funcionários - vá-se lá perceber a lógica da cabeça de um português...), ou de mais médicos no centros de saúde, nos hospitais, e nos (quase?) extintos SAP, ou de mais enfermeiros. A mim parece-me estranho que os dois países mais "paranóicos" acerca do peso da função pública sejam precisamente dois dos que estão abaixo da média europeia: Portugal e França.


Outra coisa que achei curiosa hoje ao ouvir o debate na Assembleia, é que o discurso do PM Sócrates (pretensamente socialista) parece copiado tal e qual do discurso do PM Villepin (UMP- direita). Tirou "CPE" e pôs "reformas", mas o discurso é o mesmo. Sr. Sócrates, folgo em saber que sabe francês e que sabe traduzir. Acho no entanto que o país lhe paga para escrever discursos originais, não? E já agora, visto que até sabe fazer umas traduções jeitosinhas, não quer juntar-se aos tradutores da ATTAC? Andamos sempre a precisar de quem traduza para português, e o senhor podia ser que aprendesse a dizer alguma coisa de jeito. Ou a ter algum sentido crítico... ou a dizer "qualcosa di sinistra", já que diz que é socialista.


Não posso presumir que os portugueses estejam descontentes, seria desonesto. As eleições são bem recentes e foram livres, e tanto Sócrates como Cavaco são e eram já bem conhecidos de todos. Espero que estejam felizes de terem governantes que não sabem gerir um país, preferem dirigir um cemitério. Sempre que ouvirem o desejo do Sócrates ou do Cavaco de os ver mortos, devem sorrir e pensar "que bem que votei, que feliz que estou, era mesmo isto que eu queria ouvir do meu PM, e que honra poder ter o PR a desejar que eu morra".

Ainda se fossem madeirenses, onde as eleições são «"livres"» em vez de livres... mas no continente e Açores, nada de lamúrias e sorrisinho na cara!

27 abril 2006

Lista negra!!!

Na Sorbonne foi estabelecida um lista negra por ordem do reitor. Alguns alunos são proibidos de entrar na universidade, mesmo para assistir às aulas. Não sei quando foi a última vez que a França viu medidas destas. Terá sido sob o governo de Vichy na chamada França livre, imagino. Ou sob os nazis na França ocupada...
É o governo Villepin-Sarkozy-Chirac a fazer História.

Livro desta semana

O livro desta semana está atrasado, já repararam... É que implica algumas releituras: os livros que tenho aqui são coisas que já li há bastante tempo e tenho que recapitular para poder dizer alguma coisa sobre o dito livro.
Tenham paciência e aguardem mais um pouco. Aqui está sol e para a semana volto lá para cima, para a terra do tempo imprevisível.

26 abril 2006

25 de Abril lá longe

Foto: Libération

No Nepal voltam a soprar ventos de Liberdade. Parece que para ficar definitivamente. Assim o esperemos. Será, que eu saiba, o terceiro país a festejar este dia, que parece mágico para as revoluções e libertações.

Em 1945, a 25 de Abril, a Resistência Italiana conseguiu vencer a sua luta e libertar Milão dos invasores nazis e dos fascistas.

Em 1974 ouviu-se o Zeca cantar a "Grândola" na rádio portuguesa e pouco depois todos lhe respondiam: "Vitória, Vitória".

Como será que se diz "Vitória" em nepalês?

24 abril 2006

Amanhã!


Obrigada Otelo, obrigada Salgueiro Maia. Obrigada a todo o MFA.
Faz 32 aninhos a nossa Liberdade!

Já está na altura de ganhar maturidade e de a vermos com normalidade. Comemorar o 25 de Abril também é ir às festas que se organizam por todo o lado, também é ensiná-lo às novas gerações, e relembrá-lo. É sobretudo não esquecer o que se fez, o que se teve quase a conseguir, e perceber que nada disso é utópico.

Mas acima de tudo, é perceber que a Liberdade se constrói no dia-a-dia. A Liberdade é podermos ter uma escola na nossa terra, é podermos ter filhos portugueses em Portugal, e podermos garantir-lhes um jantar na mesa todos os dias, uma escola, uma casa, um médico durante toda a vida. A Liberdade é acima de tudo, nos nossos problemas de hoje, dizer ao governo quando BASTA! e fazê-lo recuar quando é necessário. Temos Liberdade para isso, o 25 de Abril deu-nos essa Liberdade. E se a festejamos neste dia, porque é que não usufruímos dela todos os dias? A Liberdade é também a responsabilidade e o dever de Solidariedade. Talvez muitos de nós tenhamos estas garantias para os nossos filhos. Mas temos a responsabilidade de nos solidarizarmos com quem não as tem, e de as exigirmos em nome de quem às vezes nem pode fazê-lo, por não perder as poucas migalhas que lhe restam.
A Liberdade é como o voto, um direito e um dever.

VIVA A LIBERDADE!
25 de ABRIL, SEMPRE!

Precariedade - rentrée ou Abril de 2006 em Paris

Hoje recomeçam as aulas na zona de Paris. Na Sorbonne (Paris IV) e em Nanterre (Paris X), as AGs decretaram a ocupação e bloqueio das respectivas universidades.
O Presidente da Sorbonne, ordenou o lock-out logo de seguida. Pelas descrições (sim, que eu ainda estou em Lisboa, não vi nada), a polícia ainda invade (ou voltou a invadir) o Quartier Latin. Os pedidos de apoio aos grevistas e à ocupação sucedem-se.
Em Nanterre, o Presidente incitou os estudantes contrários ao bloqueio a entrar pela violência. Sempre gostava de saber como é que estes tipos chegam a Presidentes de universidades, não sei se são nomeados pelo ministério ou eleitos pela universidade...
Continuo sem notícias de Paris VIII, era suposto o lock-out acabar hoje, mas ainda não sei de nada...

Quem estiver em Paris, hoje às 21h na Sorbonne.
A informação continua disponível nas páginas ali à direita.

Agora, se me dão licença, vou para a rua, que vem aí o 25 de Abril!!!


Adenda: a Sorbonne foi evacuada pelos CRS cerca das 21h.

Esta juventude que ganha

Ainda o CPE: um artigo da "Politis" desta semana, que explica bem porque é que esta cedência do governo, ainda que parcial, é já uma vitória; e também quem é esta juventude, que os comentadores dizem estar despolitizada, mas que de há 20 anos para cá tem feito recuar cada governo, cada tentativa de legislar a precarização. Mesmo quando o governo diz que "não é a rua que governa"!

23 abril 2006

Disseram que hoje é dia do Livro

"Também sabemos doutra superstição daquele tempo: a do Homem do Livro. Nalguma estante de algum hexágono ( pensaram os homens) deve existir um livro que seja a chave e o resumo perfeito de todos os outros: deve haver algum bibliotecário que o tenha estudado e seja análogo a um deus. Na linguagem desta zona hão-de persistir ainda vestígios do culto desse funcionário remoto. Fizeram-se muitas peregrinações à procura d`Ele. Durante um século percorreram em vão os mais diversos rumos. Como localizar o venerado hexágono secreto que o alojava? Alguém propôs um método regressivo: Para localizar o livro A, consultar previamente um livro B que indique o sítio de A; para localizar o livro B, consultar previamente o livro C, e assim por diante até ao infinito...Foi em aventuras destas que desperdicei e consumi os meus anos de vida. Não acho inverosímel que nalguma estante do universo haja um livro total; rogo aos deus ignorados que um só homem -um só que seja, há milhares de anos! - o tenha examinado e lido. Se não forem para mim a honra e a sabedoria e a felicidade, que sejam para outros. Que o céu exista, mesmo que o meu lugar seja o inferno. Que eu seja ultrajado e aniquilado, mas que num instante, num ser, a Tua enorme Biblioteca se justifique."
Jorge Luís Borges, Ficções/A Biblioteca de Babel

Ainda a Guidinha

Sttau Monteiro para a Helena no AspirinaB

21 abril 2006

Também é Abril no Nepal

Mais uma vez, mesmo quando a Democracia está abolida, é o Povo quem mais ordena. Não há volta a dar-lhe. Mais tarde ou mais cedo, com mais ou menos custos, apesar da repressão e das mortes, são as pessoas que decidem da sua vida e do seu país.

Adenda: Segundo as notícias de hoje, a polícia voltou a carregar a matar gente. Mas enquanto as pessoas não desistirem e lutarem, é certo que o vão conseguir.

Acham que eu ando desaparecida? E o Carrilho?

Pois ando. Mas se o Carrilho pode, porque é que eu não posso? Além disso, isto do blog para mim é um passatempo, aqui no Assédio não há trocos para ninguém. Já a Assembleia da República e Municipal para o Carrilho...
Se pensarmos bem, quem paga ao deputado (2 vezes) Carrilho são também as pessoas que estão com contratos precários por causa dele. Essas pessoas, se faltarem não recebem, e se faltarem muito são despedidas.

Porque raio é que um deputado não é um trabalhador como outro qualquer, nas mesmas condições? Porque são tratados como cidadãos especiais? A ideia de Democracia exige alguma organização, e no seu estado mais puro, exigiria que nós, cada um e todos nós, discutíssemos em fórum aberto o melhor para o país, e que tudo fosse levado a votação generalizada. Claro que isto é impraticável, porque não conseguimos reunir-nos todos num só lugar, os debates seriam impossíveis, e ainda porque não podemos (e não queremos) ser todos deputados. Para um funcionamento correcto da sociedade e do país, também têm que haver carpinteiros, professores, médicos, engenheiros, actores, canalizadores, enfermeiros, etc. Por isso, inventou-se um sistema de representação, em que cada grupo de cidadãos é representado no Parlamento por alguém em quem tem confiança e que defende as ideias desse grupo. Esse alguém é apenas um outro cidadão, mais um entre outros, que em vez de ser advogado ou secretário ou outra coisa qualquer, é deputado.
Um deputado é eleito por ter a confiança de um grupo de cidadãos. Se a quebra, sabendo que o seu cargo/profissão apenas tem como base a confiança, eu não vejo dúvida nenhuma: despedimento por justa-causa. Destino seguinte: centro de emprego da área de residência, como qualquer outro cidadão.
Porque é que nós temos que continuar a pagar-lhes até às próximas eleições para nada, por um trabalho que não é feito, por faltas injustificadas?

E se fizéssemos todos o mesmo? Os transportes, as escolas, os hospitais, os empregados das companhias de água, electricidade e gás... O deputado, se tivesse um problema de saúde, chegava ao Hospital e ouvia na recepção: "sabe, o sr. dr. esteve cá de manhã a assinar a folha de presenças, mas agora tinha um almoço importante, já não está". E se precisasse de um canalizador lá em casa? O canalizador chegava, assinava a folha, passava o recibo, era pago e saía no mesmo instante sem mais demoras.

A Democracia é fantástica, mas esquecemo-nos de uma coisa: é que são os deputados a legislar o seu próprio regime de trabalho.

20 abril 2006

Oitavo livro à Quarta

Esta semana sai à quinta porque o próprio livro não tem nem teve data certa de nos aparecer mas que 1800 anos depois o texto o Evangelho segundo Judas sair de uma gruta no Egipto parece vir dizer-nos que de facto a verdade (deus?) emerge. Talvez em meia dúzia de anos esteja pronta a primeira tradução do texto quase completo.

19 abril 2006

A língua portuguesa é pátria de quem?

Ontem no Público - "...o touro solta pelas ruas..."
Hoje na TVI uma repórter que acompanhava o enterro do jovem actor - "...arriscaria-me a dizer que estão milhares de pessoas..."

18 abril 2006

14 abril 2006

Portugal, circa 1500

O Lusitano
Gérard Lesne
Ensemble Circa 1500
Dir. Nancy Hadden

Se nós não investimos e não investigamos a nossa música, há quem o faça e lhe dê o real valor que tem, e que é muito! Aqui está a prova: a nossa música do século XVI.

Estas duas peças trazem-me excelentes recordações da adolescência. Cantei-as várias vezes, com várias formações, e diverti-me sempre!

Esta primeira é de crítica social. Borzeguis, pelo que soube, eram sapatos. E pelos vistos, sapatos pretos era coisa que não se queria na corte.


Não tragais borzeguis pretos

Não tragais borzeguis pretos
Que na corte são defesos
Ora com borzeguis pretos

Não tragais o que defeso
Porque quem trae o vedado
Anda sempre aventurado
A ser avexado e preso

Verenvos andar aceso
Ora em cuydados secretos
Ora com borzeguis pretos

Não tragais borzeguis pretos
Que na corte são defesos
Ora com borzeguis pretos

Porque quem trae o vedado
Anda sempre aventurado
A ser avexado e preso

Creyabos andar aceso
Ora em cuydados secretos
Ora com borzeguis pretos

Não tragais borzeguis pretos
Que na corte são defesos
Ora com borzeguis pretos

E se saber a razão
Deste meu trago quereis
A cor que trago nos pés
Me deu do coração

Porque os meus cuydados
Acesos e mais secretos
Eram a ventura pretos.



Esta segunda explica-se a ela própria...

Puestos estan frente a frente

Puestos estan frente a frente
Los dos valerosos campos,
Une es del Rey Maluco,
Otro de Sebastiano
El Lusitano.

Moço animoso y valiente,
Robusto, determinado,
Aunque de poca experiencia
Y no bien aconsejado,
El Lusitano.

Brama que envistan los moros
Y el exército contrário
Ya se vá llegando cerca
A ellos dize Santiago,
El Lusitano.

Dispara la artelharia,
La nuestra mal disparando
Llueven balas, llueve muerte,
Saetas y mosquetazos.
El Lusitano.

Que por los lados ya todos
Es vanguardia nuestro campo
Y con sangre de los muertos,
Está echo un grande lago.
El Lusitano.

Todo lo anda el buen Rey,
Dando muertes muy gallardo,
La espada tinta de sangre,
Lança rota, sin cavallo.
El Lusitano.

Que el suyo passado el pecho
Ya no puede dar un passo,
A Jorge Dalbiquerque pide
Le dè su rucio rodado.
El Lusitano

Daselo de buena gana,
Y el Rey cavalga de un salto,
Mirale el Rey como jaze,
De espaldas casi espirando.
El Lusitano.

Mas le dize que se salve,
Pues todo es roto en pedaços,
Y el Rey se vá a los moros,
A los moros, Sebastiano,
El Lusitano.

Busca la muerte en dar muertes,
Sebastiano el Lusitano,
Diziendo aora es la hora,
Que un bel morir, tuta la vita honora.

'Atão... quando rezam a Nª Srª de Fátima ficam a saber!

Primeiro, nada disto tem absolutamente nada a ver com a generalidade dos católicos, nem sequer com a religião em si.

O Papa é que, coitado, de andar em penitências com aquela idade, a cabeça ressente-se... Sim, deve ser isso, uma quebra de vitaminas no neurónio. O neurónio, pois claro, acham pouco? Se tivesse dois neurónios, teria pensado o seguinte: como é que quer que os católicos saibam o que ele diz se não podem ler jornais em papel, nem ir à net, nem ver os telejornais?
Será que os jejuns da Quaresma não podiam passar a incluir um jejum de asneirada?


Esta agora é que é tramada para o jornalista Paulo Portas... andou ele a sacrificar a dignidade em penitência, a dizer em público que a Nª Srª de Fátima tinha mudado as correntes do mar para levar embora o petróleo do Prestige, e agora afinal é um herege produtor de notícias! Essas heresias que corrompem as pessoas! E comenta na televisão! E fartou-se de dar origem a notícias quando era ministro do Mar (e de mais o quê?)!

13 abril 2006

Axé, moça!

Jorge Amado
Bahia de Todos os Santos


Na verdade já é quinta-feira... isto de estar em casa muda completamente os meus horários rotineiros. É possível que enquanto eu estiver aqui estes posts de dias fixos se atrasem um pouco. Agora vamos ao que interessa!

Há alguns anos, na Feira do Livro, eu tinha como objectivo principal comprar um livro do Jorge Amado. Não tinha lido nada dele e achava impensável não o fazer com toda a urgência. Encontrei este livro "por acidente": eu esperava um romance, primeiro desiludi-me, mas depois voltei a pegar-lhe e já não consegui largá-lo. Também nunca mais deixei de ter a ideia de ir à Bahia. Apaixonei-me por uma cidade num continente onde nunca estive! Parece impossível? Eu também achava...

O Jorge Amado descreve (com aquela escrita dele... parece temperada com especiarias) o que é a Bahia e o que é ser bahiano. Oficialmente a cidade chama-se São Salvador, mas um bahiano a sério chama-lhe Bahia. Como diz o autor, é nas ruas que se diz o nome de uma cidade, e esta é Bahia desde que foi fundada em 1549.
Fala da música, da literatura, da arquitectura, da pintura: a Arte e os artistas da cidade. Mas dos movimentos literários passa ao candomblé e às ruas. As procissões, as festas católicas da Conceição, que é também Iemanjá, dona das águas. E sabe-se depois que Iemanjá viaja na mesma barca que o Senhor dos Navegantes, na procissão marítima deste santo. Fala do Carnaval, dos edifícios e monumentos. É um livro sobre África, Europa, América do Sul: todas as raças, todos os povos e todos os credos.
No fim de uma visita pelos orixás, voltamos aos serões em casa do Jorge Amado e da sua Zélia, ou dos amigos.
E claro, não pode acabar sem um espaço comercial!

Um último conselho do mestre:

"Compre poesia, ela é tão essencial quanto o pão"

12 abril 2006

Encontrei-os!

Lisboa e o Tejo! Continuo a não encontrar igual...


Durante as próximas semanas as notícias de Paris vêm pelos jornais e os blogs... Entretanto, aconselho vivamente a entrevista de Villepin à TF1 na segunda-feira à noite (video com o nome Le CPE, "une épreuve", selon Villepin"). Esclarecedor, primeiro na forma como o entrevistador faz as perguntas sem deixar de apontar as contradições do PM, e segundo pela já nossa conhecida frase - sobretudo se repetida como também neste caso - "não tenho quaisquer ambições presidenciais". Eh lá... agora que fiz a tradução isto ainda soa mais familiar!

Encontrei-o!

E ao chegar a casa...
o Poema para Galileo do António Gedeão. O tal que eu não ouvia há muitos anos. Agora sei que foi gravado em 1969 num disco chamado "Mário Viegas diz Poemas".
Edição actual do Público dirigida por José Niza.

Obrigada António Gedeão, obrigada Mário Viegas, obrigada José Niza...
Obrigada mãe!

Nota: com pena (porque é tão bom ouvir o Mário Viegas, não é?) tirei os múltiplos leitores. Talvez fosse uma das causas dos problemas a carregar e comentar no blog.

Prodi

A Itália está diferente!
Primeira medida anunciada: retirada do Iraque. Não imediata, como fez Zapatero, mas ainda assim, uma retirada.

Berlusconi

Diz que as eleições foram fraudulentas.

Cada um fala do que sabe...
ou de como uma confissão pode ser clara e velada ao mesmo tempo.

10 abril 2006

França - A luta continua

Hoje a situação ainda não é clara. Alguns sindicatos apelam ao levantamento dos bloqueios de escolas e universidades, outros à sua continuação... Há uma manifestação convocada para amanhã, e sobre a qual não há mais notícias.

O CPE foi retirado, mas a lei em que estava inserido, cinicamente chamada Lei para a Igualdade de Oportunidades, mantém-se. O CNE (Contrat Nouvelle Embauche - igual ao irmão mais novo CPE, mas dirigido a pequenas empresas e a trabalhadores de todas as idades) mantém-se. A precariedade, essa, mantém-se também.

As novas medidas anunciadas pelo governo são olhadas com desconfiança por parte dos estudantes, que preferem estudá-las a fundo antes de dar grandes mostras de alegria. Estão habituados a um governo que dá o dito por não dito, muda o nome, baralha e tenta dar de novo. Desta feita, Villepin propõe-se fazer aprovar um sistema baseado em contratos especiais para jovens que já existiam e estão em vigor, financiando as empresas que empreguem jovens com pouca formação. Um deles, O CIVIS, é um contrato de inserção social que prevê o pagamento de um máximo de 900 euros por ano se o emprego do jovem não fôr remunerado (emprego não remunerado???????). 900 euros anuais, ou 75 mensais, é o suficiente para comer uma baguete por semana e não chega nem para um quarto (o salário - mensal - mínimo em França é de 1 217,88 euros; um pequeno quarto em Paris custa cerca de 200 ou 300 euros mensais).

O Povo unido jamais será vencido! - Itália

Também em Itália, e desta vez nas urnas, o Povo derrubou aquela que terá sido a primeira ditadura versão século XXI.
Berlusconi obteve o poder em eleições, através de propostas e uma imagem populista e aparentemente divertida, o regime teve o seu grande apoio e fundamento numa censura conseguida pela concentração dos meios de comunicação nas mãos do próprio Presidente do Conselho (brrr... espero que o Prodi mude esta designação).

Berlusconi pode continuar a dominar as televisões e os jornais, mas a população mostrou que nem assim consegue dominar por muito tempo o pensamento.

O Povo unido jamais será vencido! - França

Morreu o CPE.
Ganhámos esta batalha!!!


Com uma "lata" descomunal, Villepin conseguiu aparecer ao país, retirar o CPE e não se demitir. Diz que "foi mal compreendido", coitado...
O governo, mais uma vez, entrou em confronto com a população e perdeu em todas as frentes: na manutenção dos compromissos assumidos, nas sondagens, na unidade Chirac/ Villepin/ Sarko, na credibilidade. As estratégias securitárias e os exageros policiais e judiciais, em vez de assustarem a população, são denunciadas e ajudaram até a aumentar a contestação e a solidariedade.

A população, essa, provou mais uma vez o que é a Democracia, e quem tem realmente a última palavra. Com unidade e mobilização foi mais uma vez o Povo quem mais ordenou.

Berardo`s Business

(...)Resumindo o acordo: das quatro mil obras de arte da colecção do empresário, apenas 862 fazem parte do protocolo e passarão a ocupar o centro de exposições do Centro Cultural de Belém (CCB), totalmente cedido a uma nova fundação privada. Esta fundação terá como presidente honorário e vitalício Joe Berardo, que fica com o poder exclusivo de nomear ou destituir o director do futuro museu, que terá o seu nome. O Conselho de Administração é composto por dois membros designados por Berardo, os únicos que podem deliberar a fusão, cisão, dissolução ou transformação da fundação.A nova fundação será subsidiada pelo Estado e os custos inerentes ao funcionamento do museu serão suportados pelo CCB. Este vende os bilhetes, mas o dinheiro é para a fundação. O protocolo prevê o investimento anual do Estado de 500 mil euros para aquisição de novas obras. Custos logísticos, manutenção e recuperação serão a cargo do Estado.Já assinado o protocolo, não se sabe como será o museu, quem o vai dirigir e qual o valor do reportório artístico. Dez anos de negociações com o Estado português, dez reuniões com este Governo, dez anos de acomodato das peças. No final deste período, a colecção pode ou não continuar em Portugal. Se o Estado quiser comprar a colecção, terá de ser, pelo menos, pelo valor a ser determinado por uma leiloeira. Mas Berardo não fica obrigado a vender.Ao abrigo deste acordo, Lisboa dificilmente poderá receber outros grandes certames e inserir-se no circuito internacional de exposições. Já Berardo garantiu que pode continuar a expor pelo mundo fora. (...)

Joana Amaral Dias in DN d`hoje

08 abril 2006

Primeiro, J., temos que pensar pôr a coluna à esquerda. Vê lá que este post era para ter o título "acrescentos à coluna da direita"... tirei-o logo, claro!

Acrescentei um especial CPE, com várias páginas de informação alternativa sobre este assunto, algumas das quais descobri agora mesmo.

O Indymedia é um forum onde cada um diz mais ou menos o que lhe aprouvem. Tem boas informações em directo (não faço ideia como é que o pessoal posta no meio de uma manif, mas lá que postam, postam!), mas também tem muita coisa errónea ou provocatória... de qualquer modo, foi lá que descobri grande parte destas ligações, e também que um grupo de estudantes espanhóis vem aí a caminho em solidariedade.

O Stop CPE é uma espécie de página oficial do movimento, que congrega as principais organizações que o dinamizam: sindicatos de estudantes e associações.

A Fototeca é uma página extraordinária, com as fotografias não oficiais de tudo quanto é lutas e movimentos, com divisões por temas.

Jussieu em luta: Jussieu é umas das universidades de Paris que está ocupada. A página tem muita informação sobre todo o movimento, os julgamentos dos estudantes detidos nas manifestações, e sobre o CPE, sem se restringir apenas a Jussieu.

E finalmente, a grande descoberta de hoje. Até que enfim consigo perceber o que se passa em Paris 8 - Saint-Denis! Esta página também tem uma boa lista de ligações para mais informação.


Que se passa em Paris 8 e em Lisboa?

Primeiro, que tudo, as coisas mais breves: o Cyril saiu de coma e está a melhorar.
Terça-feira anuncia-se nova jornada de luta.


A minha universidade (Paris 8) foi fechada ontem, quinta-feira, às 17h. Hoje, lá à porta, o cartaz apenas dizia que a faculdade estava fechada até dia 24 de Abril, sem explicações. Há quem lhe chame lock-out: o Presidente decidiu, está decidido, e nem tem que prestar declarações a ninguém...

Na véspera tinha sido decidido o bloqueio em AG. A greve durava há várias semanas e tinha até alastrado à biblioteca: os funcionários fecharam-na e montaram uma biblioteca especial CPE à porta, com a legislação referente, artigos de jornais franceses e internacionais, um espaço de tribuna livre...
Duas semanas antes, o mesmo presidente declarou semana aberta na universidade. Resumindo, abriu todo o espaço às organizações e associações que entendessem discutir seriamente o CPE e todo o movimento: vieram economistas, sociólogos, jornalistas, psicólogos, etc. e debateu-se a sociedade, os contratos de trabalho, a precariedade em geral, a relação deste movimento com o das "banlieues", a história dos movimentos estudantis e sociais.

Não parece da mesma pessoa, pois não?

O movimento de estudantes de Paris 8 prossegue durante as férias, com sede agora em Paris III.


Quanto a movimentos de solidariedade, houve em vários países. Na Grécia, por exemplo, houve uma manifestação e os alemães têm sido incansáveis. Nos dias de maiores manifestações vêm cá, outras vezes há manifestações frente às embaixadas francesas. E em Lisboa, que se passa? Há ecos, há alguma repercussão?

06 abril 2006

Rêve Générale I


É o autocolante mistério deste movimento: não está assinado, não se sabe bem de onde aparece, mas está em todo o lado. E o slogan, de tão bonito, pegou.
Claro que há sempre uns cretinos que não entendem e dizem que há um erro gramatical... enfim. Imagino que em 68 houvesse quem não entendesse o "sous les pavés la plage"...

O do autocolante do PCF também é lindíssino: "De battre le pavé mon coeur s'est relancé".

05 abril 2006

Rêve Générale II

Não escrevi nada ontem, porque o que sei é praticamente o mesmo que li nos jornais e ouvi na rádio...
Sei que dia 28 de Março, apenas algumas estimativas apontavam para 3 milhões de pessoas. Ontem foi inequívoco: 5% da população francesa!!!
Segundo as últimas sondagens, 45% da população acha que o "période d'essai" do PM acabou. Tá cheinho de sorte: tem direito a justa causa, pré-aviso, e uma reforma que não merece.
Os que desaprovam esta lei são 64%.
Na Assembleia, Villepin declarou que "vai tirar todas as conclusões necessárias durante os próximos dias". Não explicou o que queria dizer, mas não deve ser o que estamos todos a pensar: revogação da lei e demissão.

O Chirac, que não é parvo, promulgou a lei recomendando mudanças, porque isso lhe permite tirá-la das mãos do PM e pô-la na Assembleia Nacional. Ora, na AN há uma maioria do UMP, cujo líder parlamentar depende directamente do líder partidário: Sarko. A lei está portanto nas mãos do tipo da "racaille" e do "kärcher": a extrema-direita mais mal disfarçada a seguir ao Le Pen.
A diferença é que, ao contrário de Villepin que faz birra e beicinho, recusando-se terminantemente a retirar a lei, Sarko é mais hábil. O primeiro é de direita, mas tem ainda resquícios de tiques de um francês democrata. O segundo é claramente (mas nunca assumidamente) um fascista, age pela calada, manipulando a opinião pública com operações de propaganda do regime. Tem mais possibilidades de ser bem sucedido.


Ontem no fim da manifestação, e depois de a polícia ter prendido centenas de pessoas, o Sarko foi à Place d'Italie em mostra propagandista. Apenas para ser visto, para mostrar que está no mesmo local que os manifestantes (muitas horas depois, mas isso não tem que ser dito na reportagem), que a polícia funciona e que em poucas horas a situação estava controlada e os "casseurs" presos...
Hoje vi já um comentário no Indymédia que denuncia a existência de polícias entre os "casseurs". Não sei se é verdade, mas não me espanta. Aliás, já há dias em conversa com uma amiga francesa (e que portanto conhece melhor a situação e a sociedade) ela disse-me que os grupos de extrema-direita são constituídos entre outros por CRS.

Há também notícias de uma rapariga de 17 anos encontrada morta na cela onde estava detida provisoriamente. Segundo a descrição ela tinha epilepsia, mas estava numa esquadra cheia de polícias e morreu sem qualquer assistência e sem estar vigiada nem acompanhada.
O Cyril continua em coma, apenas com ligeiras melhoras. Os procedimentos legais para esclarecer e punir os culpados sucedem-se por parte da família e do SUD (sindicato a que ele pertence), mas nenhum deles avança.

Mudando de assunto, no Le Monde nota-se já a manipulação do Sarko: coitadinhos dos pobrezinhos dos CRS, tão desgraçadinhos e cansadinhos que andam... Isto de andar armado até aos dentes e com protecção completa, a bater em putos maioritariamente desarmados é muito cansativo...



Próximos capítulos

É o que dizem os jornais: hoje e amanhã há negociações (quer dizer... reuniões na AN), os sindicatos deram até 17 de Abril para a AN revogar a lei. Negociações verdadeiras só depois da lei revogada. Segunda-feira há nova reunião inter-sindical.

Os estudantes andam em pequenos grupos, organizando operações surpresa: bloqueiam linhas de comboio, estradas, etc. As faculdades continuam bloqueadas ou em greve, e as hostilidades com os apoiantes do CPE nas universidades vão subindo de tom.

Sétimo Livro à Quarta

Contos do Gin Tónic
Mário Henrique Leiria, 1973


Eu bem sabia que em 73 lançaras os Contos do Gin-Tonic e nos princípios de 74 os Novos Contos do Gin. Mas só depois da Revolução dos Cravos é que a tua prosa pega como fogo em palheiro, sucessivas edições de um e outro livro. Como é possível a surrealidade converter-se de repente em best seller? Tenho um exemplo à mão que talvez explique o fenómeno: durante a maré-cheia de Abril os meus três filhos navegam da adolescência para a juventude. E é a ti, ó Mário-Henrique, é justamente a ti que eles escolhem para figura emblemática do vendaval. Os teus contos e os novos contos do Gin-Tonic, por causa da irreverência e rebeldia, são para eles apetitosas cartas de marear. Está explicado? Faço-me entender?
Já tinhas dado à sola desta vida quando o actor Mário Viegas, no teatro e na tv, começou a interpretar os teus Contos do Gin-Tonic. Nós de olhos fixos ora no palco, ora na tela, pontaria, garra e graça, ver e ouvir, ao mesmo tempo fruir dois Mários, o Leiria a escrever, o Viegas a dizer. Pena que não tivesses assistido aos espectáculos, bem sentimos a tua falta. Em 96 o Mário Viegas passou-se para o Além, também ele. Acho que foi à tua procura.
Agora, para recordar os velhos tempos, vou beber, de enfiada, nove dos teus copos de Gin-Tonic. Aí vou eu, aí vens tu:
Os Contos do Gin Tónic publicados em 1973 seguidos em 1974 pelo Novos Contos do Gin Tónic são dois livros incontornáveis. A que se regressa. A que se deve regressar. Mais do que a corrente surrealista onde este autor andou metido também nas artes plásticas é o absurdo existencialista, aqui bem humorado, se estas coisas se quiserem arrumar um pouco, que prevalece e se torna arma. Coisa que na literarura como na arte me parece ser ou necessidade ou a mesma coisa.



"TORAH

Jeová achou que era altura de pôr as coisas no seu devido lugar. Lá de cima acenou a Moisés.
Moisés foi logo, tropeçando por vezes nas lajes e evitando o mais possível a sarça ardente.
Quando chegou ao cimo, tiveram os dois uma conferência, cimeira, claro. A primeira, se não estou em erro.
No dia seguinte Moisés desceu. Trazia umas tábuas debaixo do braço. Eram a Lei.
Olhou em volta, viu o seu povo aglomerado, atento, e disse para todos os que estavam à espera:
- Está aqui tudo escrito. Tudo. É assim mesmo e não há qualquer dúvida. Quem não quiser, que se vá embora. Já.
Alguns foram.
Então começou o serviço militar obrigatório e fez-se o primeiro discurso patriótico.
Depois disso, é o que se vê.
RIFÃO QUOTIDIANO
Uma nêspera
estava na cama
deitada
muito calada
a ver
o que acontecia
chegou a Velha
e disse
olha uma nêspera
e zás comeu-a
é o que acontece
às nêsperas
que ficam deitadas
caladas
a esperar
o que acontece
CASAMENTO
“Na riqueza e na pobreza, no melhor e no pior, até que a morte vos separe.”
Perfeitamente.
Sempre cumpri o que assinei.
Portanto estrangulei-a e fui-me embora."
1923: A 2 de Janeiro Mário-Henrique Leiria nasce em Lisboa. - 1942: É expulso, em Lisboa, da Escola Superior de Belas Artes, talvez por motivos políticos. - 1949/51: Participa nas movimentações surrealistas portuguesas, entre as quais a obra colectiva Afixação Proibida. - 1952/57: Vários empregos: Marinha Mercante, caixeiro viajante, operário metalúrgico, servente de pedreiro, etc... Viaja pela Europa ocidental e central, também pelo norte de África. - 1958: Visita a Inglaterra. - 1959: Casa, em Lisboa, com uma rapariga alemã; dois anos depois o casal irá separar-se. - 1961: “Operação Papagaio” e MHL é detido pela PIDE. Parte para o Brasil. - 1970: Regressa a Portugal. - 1973: Publica Contos do Gin-Tonic. - 1974: Publica Novos Contos do Gin. Revolução do 25 de Abril, em Portugal. - 1975: MHL é o chefe de Redacção de O COISO, suplemento semanal do diário A REPÚBLICA. Publica Imagem Devolvida, Conto de Natal para Crianças e Casos de Direito Galáctico seguido de O Mundo Inquietante de Josela (fragmentos). - 1976: Adere ao PRP (Partido Revolucionário do Proletariado) - 1979: Publica Lisboa ao voo do pássaro. - 1980: A 9 de Janeiro morre em Cascais (degenerescência óssea).

Peço imensa desculpa...

...a todos, mas só agora reparei que as ligações estavam erradas. O terceiro e quarto leitores já estão a funcionar.

Para relembrar, cá vai a autoria dos poemas ditos pelo Mário Viegas: no terceiro leitor está a "Carta aos meus Filhos sobre os Fusilamentos de Goya", de Jorge de Sena, e no quarto está um poema de 1902 sobre Cuba no século XIX, de Nicolas Guilén: "Há muito tempo..."

03 abril 2006

É que a Liberdade está a passar por aqui!

Dia 26 de Março foi um dia histórico em França no caminho para a resolução dos problemas que levaram aos distúrbios de Novembro. O referendo de Saint-Denis foi até hoje a única medida que realmente traz um contributo positivo para a inserção dos imigrantes e o estabelecimento dos direitos que lhes caberiam numa sociedade realmente livre, igual e fraterna.

Saint-Denis é uma cidade junto a Paris, a Norte, onde um quarto da população é imigrante e onde se deram grande parte dos distúrbios de Novembro. É também, como se pode facilmente adivinhar, uma das zonas mais pobres da região Île-de-France (mais desemprego, mais pequena criminalidade, etc.). A título de exemplo, a linha 13 do Metro, que serve esta zona, é a mais frequentada de todas, mas uma das que tem menos limpeza, menos melhoramentos, menos cuidados.

No último dia 26, o presidente da câmara de Saint-Denis (maire), comunista, organizou um referendo onde puderam participar todos os residentes na cidade, quer tenham oficialmente direito a voto ou não. Deviam pronunciar-se sobre o direito de voto e a elegibilidade dos estrangeiros em França: 64,1% disse sim aos direitos.
A Prefeitura (préfecture)*, como é costume destes organismos, mandou logo a coisa para tribunal, que declarou o referendo ilegal.

Não importa. Outros concelhos em todo o país preparam já referendos similares, fica a opinião da população claramente declarada, e o exemplo. Os resultados, podem não ser considerados oficiais, mas o referendo organizado pela Câmara (mairie) decorreu com a normalidade de qualquer eleição nacional. Os resultados são por isso absolutamente fiáveis, sendo um fortíssimo indicador para o governo e a Assembleia Nacional.

Ler mais:
o artigo do Libé
aproclamação dos resultados pelo Maire de Saint-Denis no dia 26 de Março


* A Prefeitura em França é o organismo local que rege a polícia de cada departamento, e onde se agregam os serviços estatais. É na Perfeitura de cada departamento que se situa os serviços de estrangeiros, identificação, a direcção de viação, etc.

Abril





Durante este mês recorda-se o Abril de há 32 anos no Troll e no Pópulo. Ao longo do mês a Isabel e a Emiéle vão recordar o que viveram naquela época.
São memórias pessoais que contam a história do país; muito interessante sobretudo para nós, a geração dos Filhos da Madrugada.

01 abril 2006

MANIFESTO ANTI-CAVACO


MANIFESTO ANTI-CAVACO
E
POR EXTENSO
PELA U.D.P
UNIÃO DE POETAS
"DA ESQUERDA A VALER"
HUMORISTAS, FUTURISTAS,
REVOLUCIONÁRIOS
E
BOA GENTE E TUDO




MANIFESTO ANTI-CAVACO
BASTA PUM BASTA

Uma geração que consente deixar-se representar por um Professor Aníbal Cavaco Silva é uma geração que nunca o foi. É um coio d´indigentes, d´indignos e de cegos! É uma resma de charlatães alaranjados e de vendidos, e só pode votar e parir abaixo de zero!
Abaixo a geração laranja!
Pôrra pró Cavaco, pôrra! Pim!
Uma geração com um Cavaco Silva a cavalo, é um burro algarvio incompetente!
Uma geração com um Eng. António Guterres à proa é uma canoa em seco!
O Manuel Monteiro é um magano!
O Fernando Nogueira é meio-mangano!
O Anibal Silva saberá gramática, saberá sintaxe, saberá vender gasolina, saberá inglês, saberá tudo, menos dirigir económica e politicamente o País, que é a única coisa que ele quer fazer e nunca o fez bem, nem soube fazer!
O Cavaco pesca tanto de Economia, que até faz quadras à António Aleixo, com as ligas da sua Maria Cavaca!
O Gueterres é um habilidoso!
O Carlos Carvalhas veste-se mal!
O Manuel Monteiro usa ceroulas de malha!
O Paulo Portas especula e inocula os concubinos!
O Cavaco é Aníbal!
O Cavaco é Guterres!
Pôrra, também pró Gueterres, pôrra! Pim!
O Professor Cavaco tem feito uma política para Portugal, que tanto podia ser como a do Fernando Nogueira ou a Maria Cavaca ou a Leonor Beleza, ou o Eng. António, ou a Teresa Patrício Gouveia, ou a Nau Catrineta, ou a cantora Dina do Partido Popular!
E o Cavaco teve claques e maiorias absolutas!
E o Nogueira teve palmas! E o António Guterres agradeceu de mão dada com o Jaime Gama!
O Francisco Louçã é um manganão!!
Não é preciso ir para a Fonte Luminosa vestido de laranja, para se ser uma laranjada!
Não é preciso saber contar pelos dedos, para se ser Professor de Economia, basta fazer contas pelos dedos como o Silva! Basta não ter escrúpulos, nem morais, nem artísticos, nem humanos! Basta andar com as modas europeias, com as políticas comunitárias e com as opiniões de Bruxelas! Basta usar o tal sorrizinho com escuma ao canto dos lábios, basta ser muito penteadinho por um barbeiro de bairro, usar figos algarvios e cócos marroquinos e olhos de Sá-Carneiro mal morto em Camarate! Basta ser Judas! Basta ser Fernando Cavaco Nogueira Silva!
Pôrra pró Cavaco! Pôrra! Pim!
O Professor Aníbal Cavaco Silva nasceu para provar, que nem todos os que governam sabem governar.
O Fernando Nogueira é um autómato extra-terrestre que deita para fora o que os trabalhadores pobres já sabem que vai sair... Mas é preciso que os trabalhadores pobres paguem impostos! Os ricos, não!!
O Nandinho Nogueira é um verso-de-pé-quebrado dele próprio!
O Cavaco em génio nem chega a uma garrafinha de mau-cheiro e em talento o Nogueira é pim, pam, pum!
O Cavaco nu é horroroso!
O Cavaco escuma dos cantos da boca!
Pôrra pró Cavaco, Pôrra! Pim!
O Nogueira é o escárnio da consciência!
Se o Cavaco Silva é Europeu eu quero ser Australiano!
O Vasco Graça Moura é a vergonha da intelectualidade portuguesa!
O Vasco Pulido Valente é a meta da decadência mental!
E ainda há quem não core quando diz que apoia o Cavaco!
E ainda há quem lhe estenda a mão!
E quem lhe lave a roupa, manchada de sumo de laranja, que custa imenso a sair!
E quem tenha dó da gazolineira dos Cavacos!
E ainda há quem esteja indeciso de que se votar no Nogueiro-Cavaco não vale nada, e que não serve para nada, e que nem é inteligente, nem decente e é um voto contra si próprio, que nem chega a zero!
Vocês não sabem quem é a senhora Mariani do Cavaco? Eu vou-lhes contar:
A princípio, por notícias das "Olás", entrevistas, tempos de antena e outras preparações com as quais nada temos a ver, pensei tratar-se da cantora lírica Francesca De Mariani, italiana, que lhe escreveu várias cartas em italiano, apaixonadíssima por ele quando o viu a dormir na primeira fila do S. Carlos, durante uma récita, há uns anos atrás e a subir a um coqueiro em S. Tomé. Depois de ler todas as "Revistas do coração", de "Maria" a "Manuel", da "Dona" ao "Diabo", do "Crime", ao "Jornal de Letras e Artes e Ideias", também não fui capaz de distinguir, porque a lâmpada da minha mezinha de cabeceira é muito fraca, era noite muito escura e só a meio dum pesadelo, aí pela madrugada é que tive um sobressalto e lembro-me de consultar a "Nova Gente", a "Visão" e "Casa, Jardim e Decoração". E não é que descubro que a tal Mariani do Cavaco era a sua Vivenda algarvia! Adormeci mais descansado e comecei a sonhar o que seria viver naquele paraíso algarvio, só possível à nova sociedade de novos-ricos, criados pelo cavaquismo.
Sonho que a Maria Cavaco vem descendo uma escada estreitíssima, mas não vem só, traz também o Jacques Chirac, que eu não cheguei a ver, ouvindo apenas uma voz muito conhecida dum apaixonado por experiências nucleares e repressões aos Emigrantes em França. Pouco depois o agente do SIS é que me disse que ele vinha com uma camisola do PS, com um grande coração laranja.
A Maria Cavaco e o Chirac estão sozinhos na Vivenda, e às escuras, dando a entender perfeitamente que estiveram indecentemente a conspirar à beira da piscina, sobre a candidatura do Aníbal, à presidência da República, e o tabú do Aníbal. Depois o Chirac, completamente francês e satisfeito, despede-se e salta pela janela, com grande mágoa da Maria Laranjada borbulhante e lacrimosa. E ainda hoje os pobres turistas algarvios, a GNR, a Guarda-Fiscal, a Guarda Florestal, a PSP, e os agentes do SIS têm ocasião de observar a janela arrombada do primeiro andar da Vivenda Mariani, perto de Boliqueime, na Rua do Touro, (perdão, do Aníbal), por onde se diz que fugiu o célebre político em Portugal e bombista nuclear em Paris.
A Maria que é histérica, começa a chorar desatinadamente nos braços da sua confidente e excelente pau de cabeleira, a famosa tia Anica de Loulé...
... Vêm descendo pla dita estreitíssima escada, varias Marias todas iguais e de cigarros acessos, menos uma que usa óculos, dentes saídos para fora como uma vampira, horrorosamente feia, o que quer dizer que é a deputada Conceição Monteiro.
E seria até uma excelente personificação das bruxas de Goya, se quando falasse não tivesse aquela voz tão fresca e maviosa da ex-secretária de Sá-Carneiro. E reparando nos dois vultos interroga espaçadamente com cadência social-democrata, austeridade e imensa falta de camarate:
"Quem está aí?! E de cigarros apagados?"
- Foi o Freitas do Amaral, foi o Otelo, foi o General Eanes, foi o Mário Tomé, foi o Eng. Carlos Marques, foi o Mário Soares, foi o Álvaro Cunhal, foi o Major Canto e Castro, foi o Pinto Balsemão, foi a viúva do Soares Carneiro, foi o vento... dizem as pobres inocentes "Marias Vão Com As Outras", varadas de terror pluripartidário... E a Conceição Monteiro que só é horrrorosa nos dentes saídos, nos binóculos, nos destroços da avioneta, e em andar sempre a chatear todos os grupos parlamentares, telefona imediatamente para a sede do SIS, em Faro, que é um dó d´alma ouvi-la assim tão sá-carneirista desempregada. Vão todas para a casa de banho, mas eis que, de repente, batem no portão e sem se anunciar nem limpar-se da poeira nortenha, sobe a escada e entra p´lo salão o Eng. Eurico de Melo, que quando era novo fez brejeirices com a menina da alfarroba e da fava-rica algarvia.
Agora completamente nortenho e emendado, revela à dentuças, que sabe por relatórios secretos do ministro Dias Loureiro que há homens que vão com as "Marias Vão Com As Outras", na Vivenda e que ainda há pouco, fora detectado, por radar, um a saltar pela janela. A Sãozinha Monteiro diz que efectivamente já há tempos que Maria Cavaco vinha dando p´la falta de figos e galinhas no quintal e tão inocentinha, coitada, que naqueles oitenta anos, ainda não teve tempo para descobrir a razão da humanidade estar dividida entre homens e mulheres do PSD e homens e mulheres do PS e de outros partidos. Depois de sérios embaraços do tio Eurico é que ela deu com o atrevimento político e mandou chamar as Marias de há pouco, com os cigarros apagados. Nesta altura, este meu pesadelo policial toma um pedaço de interesse, porque o engenheiro Melo ora parece o Loureiro disfarçado de polícia-sinaleiro, ora um polícia de trânsito com a falta de educação dum agente da polícia de choque, e tão perspicaz que descobre em menos de meio minuto, o que o povinho está farto de saber - que o Cavaco anda a dormir com o Guterres!!!
O pior é que a Maria Silva foi à serra com as indiscrições do Barão do Norte e desata a berrar, a berrar como quem se estava marimbando para tudo aquilo. Esteve mesmo muito perto de se estrear com um par de murros na coroa do Chefe do Grupo da Sueca, no que se mostrou de um atrevimento, de uma insolência e de decisão social-democrata que excedeu todas as expectativas.
Ouve-se uma corneta tocar o Hino da Comunidade Europeia e da França e Maria, sentindo no ruído do escape do avião super-sónico francês, toda a alma tricolor do ser preferido, foi qual passarinha engaiolada, a correr até ao portão da Vivenda Mariani, a gritar desalmadamente pelo seu Jacques. Grita, assobia e redopia e pia e rasga-se e magoa-se e cai de costas com um acidente, de que já previamente tinha avisado o jornal "O Público" e a bandeira gigante do PSD também cai e os antigos votantes sociais-democratas também caem em si e desatam numa dessas ondas de contestação, abstenção e arrependimento tão enorme e tão monumental, que todos os jornais de Lisboa, Loulé e do Porto, no dia seguinte, foram unânimes naquele êxito político do Engenheiro Eurico de Melo e da Conceição Monteiro.
A única consolação que os ex-votantes decentes tiveram, foi a certeza de que aquilo não se tinha passado na Residência Oficial de S. Bento, mas na Vivenda Mariani em Boliqueime, com uma Maria escavacada e encavacada, que tem cheliques e exageros esquerditas.
Continue o Sr. Cavaco a mandar governar assim, que ha-de ganhar muito com as cavacas das Caldas e há-de ver que ainda apanha uma estátua de prata laranja por um ourives de Loulé e uma Exposição das maquetas pelo seu monumento erecto por subscrição social-democrata pelo "Povo Livre" a favor das vítimas da sua péssima política de apoio aos Timorenses, e a praça Dr. Francisco Sá-Carneiro mudada em Praça Professor Aníbal Cavaco Silva e com festas da cidade no Centro Cultural de Belém e sabonetes em conta. "Aníbeis Silvas" e pastas Cavacas prós dentes, e graxa Guterres prás botas, e bananas Jardim, e Niveína Durão Barroso, e comprimidos Paulo Mendo, e autoclismos Santanas e Santanas, Santanas, Santanas, Santanas... E limonadas Ferreira do Amaral - Magnésia.
E fique sabendo o Fernando Nogueira que se um dia houver justiça em Portugal, todo o mundo saberá que o autor de "Os Lusíadas" foi a Agustina Bessa Luís, que num rasgo memorável de modéstia só consentiu a glória do seu pseudónimo "A bruxa da Areosa".
E fique sabendo o Carlos Carvalhas que se todos votassem como eu, haveria tais munições de punhos fechados, de "Esquerda a Valer" e não "A Necessária" que levariam dois séculos a gastar, sem "sair da rotina da esquerda" do Francisco Louçã!
Mas julgais que nisto se resume a política portuguesa? Não! Mil vezes não!
Temos além disto o Jorge Sampaio, que já fez decretos para a Câmara de Lisboa, que deixou de ser a derrota do machão Macário Correia, para poder passar a ser a derrota do Dr. Sampaio, com notas negativas do Professor Rebelo de Sousa.
E as pinoquices do Vasco Pulido Valente passadas no tempo em que "emborcava copos" na Secretaria de Estado da Cultura e no semanário "O Independente"! E as infelicidades de Carlos Pimentinha? E o talento insólito de Urbano Rodrigues! E as gaitadas do Vilhena! E as traduções só para homens do ilustríssimo excelentíssimo senhor António Barreto? E o Frei Hermano da Câmara!
E a Leonor Beleza co-responsável por uma série de contaminações de sangue nos nossos hospitais! E as imbecilidades do Pacheco Pereira! E mais pedantices do Albeto Pimenta! E o Pinto Coelho, o cavaquista do desenho! E alguns jornalistas cavaquistas, socialistas e fascistas d´"O Público", e da "Capital", e do "Diário de Notícias", e d´ "O Diabo", e d´ "O Dia", e d´ "O Crime", e do "Correio da Manhã", e do "Expresso" e de todos, todos os jornais que não derem sempre notícias sobre a UDP nas primeiras páginas e ainda tempos de antena diários de meia hora na rádio e na TV.
E os Actores de todos os quatro canais de televisão e de todos os teatros pseudo-vanguardistas! Mário Viegas, incluído.
E todos os artistas que andaram a mamar dinheiro de Lisboa Capital Europeia da Cultura de 94 e futuramente da Expo 98 de que nós já desconfiamos! E os Valentins Loureiros do Porto e os palermas de Coimbra que não votarem UDP! E a estupidez do caso das gravuras de Foz Coa e o Dr. José de Figueiredo e oh oh os Mota Pinto hu hi e os burros de Boliqueime e os menus das festas do Centro Cultural de Belém e a Caixa Geral dos Depósitos feitos pelo Michel! E o raquítico Marques Mendes, palerma do PSD a quem o Dr. Soares com imensa piada intrujou que era mais alto do que parecia numa recepção em Belém! E todos os que são Políticos e Artistas, excepto os da UDP, como é evidente.
E as Exposições anuais no A.C.A.R.T.E. da Gulbenkian! E todas as obras de fachada? E as do Eduardo Prado Coelho em Paris; e os Vaz da Silva, os Estrela, os Josés de Magalhães, os Pintos da Costa, os Louçãs, os Arnaldos Matos, os Hermínios Martinhos, os Almeidas Santos, os Narcisos de Miranda, os Falcões e Cunha, os Jaimes Gamas, os Torres Coutos, os Fernandos Gomes, os velhos antigos salazaristas, os idiotas eanistas, os arranjistas socialistas, os racistas, os impotentes do PSN, os celerados do PP, os vendidos do PRD, os imbecis do MRPP, os párias vendedores de droga, os ascetas democratas-cristãos, os Fernandos Teixeiras da Maçonaria, os das coligações das Câmaras, os diabo que os leve, os Filipes Menezes, os Jardins, os Ricardos Pais, os La Férias, os Guedes, os Manúeis Alegres, os Esteves Cardosos, os Abrunhosas, as Veras Lagoas, os Motas Pinto, os Joões Bosco, os Alpoins Galvões, os Duartes Pios de Bragança, os Silvas Melos, os Marcos Paulos, as Zitas Seabras, as Simonetas Luz Afonso, os Mendes Botas, os Jaimes Neves, e todos os laranjas cor de rosa que houver por aí!!!!!
E as convicções urgentes do Soares Pai e as convicções catitas do Soares Filho!...
E os concertos de "Os Madre de Deus"! E as estátuas a fascistas, ao Amaro da Costa e ao despertar e a tudo! E tudo o que seja Arte e Cultura, em Portugal! E tudo! Tudo por causa do Cavaco disfarçado de Nogueira afónico!
Pôrra pró Cavaco, pôrra! Pim!
Portugal que com todos estes senhores conseguiu a classificação de País mais atrasado da Europa e de todo o Mundo! O País que tão pouco tem ajudado os irmãos Africanos e Timorenses! O exílio dos desiludidos, dos abstencionistas e dos desacreditados e indiferentes dos políticos! A África reclusa dos europeus! O entulho de lixos tóxicos europeus, da poluição e da entrada de droga internacional! O Paraíso dos ricos que não pagam impostos, nem pagam a Crise e a Fome! Portugal inteiro (incluíndo Madeira e Açores) há de abrir os olhos no dia 1 de Outubro de 1995 - se é que a sua cegueira não é incurável - e então gritará comigo, a meu lado, a necessidade que Portugal tem de ter vozes diferentes na Assembleia da República, Deputados duma "Esquerda a Valer"! Deputados da UDP, claro, e a necessidade que Portugal tem de ser qualquer coisa de asseado e despoluído.
Pôrra pró Cavaco, (e seus camaradas de várias cumplicidades, cores, silêncios e futuros compromissos), Pôrra! Pim!
Mais de oitenta anos depois do Manifesto dum tal Almada Negreiros.

UDP
UNIÃO DE POETAS "DA ESQUERDA A VALER"
HUMORISTAS, FUTURISTAS, REVOLUCIONÁRIOS
E
BOA GENTE E TUDO!!!

Manifestos

Ali ao canto, na quinta linha, está o Manifesto Anti-Dantas, de José de Almada Negreiros, Poeta d'Orpheu, Futurista e tudo, dito pelo Mário Viegas.

Aqui, já a seguir, o Manifesto Anti-Cavaco, uma adaptação que o Mário Viegas fez, e que há tempos a Gerência do bar-a-barraca publicou em capítulos.
Parece de ontem, não é? Pois é, mas tem mais de dez anos!

A Poesia II - Galileo


Aí em 91 ou 92, tive que fazer um trabalho de grupo de Filosofia sobre o Galileo. Os materiais de trabalho que a professora nos deu foram uma BD que ilustrava o poema do António Gedeão "Galileo Galilei", e uma cassette, emprestada, com a gravação audio do Mário Viegas a dizer esse poema sobre um fundo de uma guitarra que tocava. Não copiei a cassette. Convenci-me que, se a professora tinha aquela gravação, ela havia de estar editada comercialmente algures. Nunca me perdoei, e também nunca mais a ouvi . Mas ainda hoje, quando leio o poema, lembro-me das inflexões, do tom de voz, da calma terna das "margens doces do Arno às horas pardas da melancolia", da ironia na descrição de toda a cena com as "reverendíssimas criaturas".

A Poesia I

O Mário Viegas dizia poesia. Não vale a pena pôr-lhe adjectivos, porque ou pareciam demasiados, ou não seriam suficientes.
Ali no canto pus dois poemas do disco de Centenário do Almada Negreiros. Sim, já sei, falta o Manifesto. Está guardado para logo.

Lá em cima, no terceiro player (isto em português... diz-se "tocador"?), enfim, na terceira linha, está a "Carta aos meus Filhos sobre os Fusilamentos de Goya", de Jorge de Sena.

E no quarto, está um poema de 1902 sobre Cuba no século XIX, de Nicolas Guilén: "Há muito tempo..."
Claro que o "muito tempo" é muito relativo, digo eu... só o local é que se estendeu.

A música original que acompanha o disco é de Luís Cília.

A grande mentira

Era mais uma tarde a namorar no café com uma televisão em fundo a debitar imagens. A meio do namoro, a notícia. Não podia ser, era mentira. Era a mentira de dia 1 de Abril. À noite fiquei colada ao Telejornal à espera que ele aparecesse a desmentir. Era estranho, não era possível o Mário Viegas em piadinhas de conluio com a RTP, mas a alternativa era ainda mais impensável. É preciso explicar que eu não fazia a mínima ideia de que ele estava doente, para mim ele era imortal.

O desmentido não veio nessa noite, nem na seguinte. E até hoje, nada... passaram dez anos.
Bem sei que já o disse e que pareço repetir-me, mas o Mário Viegas e o Zeca são as duas pessoas que nunca conheci pessoalmente, e que me fazem falta como se fossem próximos.

Temos esta sorte, que não sabemos, de ter um país cheio de excelentes actores e muitos e muito bons grupos de teatro. O Mário Viegas era destes, aquele de que eu mais gostava e admirava. Há quantos anos foi "Na solidão dos campos de algodão" no Teatro Aberto (o velhinho), com o João Perry? Não sei, perdi-lhes a conta. Mas lembro-me da peça, da impressão que me causou.
Muitos anos depois, o Beckett - "Enquanto se está à espera de Godot". Há poucas peças de que me lembro com pormenor ao fim de alguns anos. Lembro-me do Mário Viegas e do Santos Manuel nos papéis principais, do chorrilho que o João Carracedo despejava seguidinho e a alta velocidade e da impressão que me fez ele vir pela trela com o Morais e Castro. Eu já conhecia a peça, já a tinha lido antes, e por isso mesmo, lembro-me de a ter desvendado naquela noite, de a ter finalmente percebido. É para isso que servem os encenadores, não é?

E lembro-me sobretudo de quanto me ri a vê-lo em palco ou a ouvi-lo.


Houve mais peças, mas sobretudo, houve muitas que não vi e que me fazem falta. Ainda hoje, quando me dá a preguiça e penso não ir a determinado espectáculo, é desta grande mentira que me lembro, de todas as peças do Mário Viegas que quis ter visto e que por preguiça...


Era um homem íntegro, sem concessões. Dizia sempre o que tinha a dizer e tal como tinha que ser dito, ponto final. Com ironia pontiaguda. Do piorio, portanto.

E mais música?

Há tempos comprei um disco do Janita Salomé, e apanhei uma enorme surpresa! Trouxe-o para casa, comecei a ouvir, e de repente... a voz do Mário Viegas!
Pois é, no disco "Lavrar em teu peito" do Janita Salomé há um poema dito pelo Mário Viegas, sobre um fundo de música de inspiração árabe, tocada pelo Janita, o Pedro Caldeira Cabral e o José Peixoto.

Infelizmente não consegui pô-lo online. Chama-se "O Poder" e o poeta é José Bebiano. O Mário Viegas disse-o como de costume, como ele sabia...

Não estejas onde a ave é feliz
Nem onde a onda é mais nova
Passa a mão pelo ódio

E pernoita longe daqui

O sabor a mar da vida

Contenta-se com poucas coisas.

Queriam música?

Por acaso nem era para haver... mas com o Mário Viegas, tudo se arranja! Era para tudo e para todos, ele era teatro, poesia, cinema, crítica social, política... só é difícil é saber por que ordem.

Ontem foi sexta-feira, dia de disco. Hoje, 1 de Abril, faz 10 anos que morreu o Mário Viegas, no dia das mentiras de 1996.

Por isso: "Kilas, o Mau da Fita" (1981) é um filme de José Fonseca e Costa, com música de Sérgio Godinho. Mário Viegas fazia o papel de Kilas e Lia Gama de Pepsi-Rita.
Ao longo do dia irei anunciando a banda sonora do canto, que hoje vai crescer ainda mais. Para já, em primeiro lugar, o genérico do filme. Em segundo, o Fado do Kilas, cantado pela Pepsi-Rita, apresentado pelo próprio Kilas.