Mostrar mensagens com a etiqueta poesia. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta poesia. Mostrar todas as mensagens

13 janeiro 2016

Waiting for the Barbarians

What are we waiting for, assembled in the forum?

            The barbarians are due here today.


Why isn’t anything happening in the senate?
Why do the senators sit there without legislating?

            Because the barbarians are coming today.
            What laws can the senators make now?
            Once the barbarians are here, they’ll do the legislating.


Why did our emperor get up so early,
and why is he sitting at the city’s main gate
on his throne, in state, wearing the crown?

            Because the barbarians are coming today
            and the emperor is waiting to receive their leader.
            He has even prepared a scroll to give him,
            replete with titles, with imposing names.


Why have our two consuls and praetors come out today
wearing their embroidered, their scarlet togas?
Why have they put on bracelets with so many amethysts,
and rings sparkling with magnificent emeralds?
Why are they carrying elegant canes
beautifully worked in silver and gold?

            Because the barbarians are coming today
            and things like that dazzle the barbarians.


Why don’t our distinguished orators come forward as usual
to make their speeches, say what they have to say?

            Because the barbarians are coming today
            and they’re bored by rhetoric and public speaking.


Why this sudden restlessness, this confusion?
(How serious people’s faces have become.)
Why are the streets and squares emptying so rapidly,
everyone going home so lost in thought?

            Because night has fallen and the barbarians have not come.
            And some who have just returned from the border say
            there are no barbarians any longer.


And now, what’s going to happen to us without barbarians?
They were, those people, a kind of solution.

(C.P. Cavafy, Collected Poems. Translated by Edmund Keeley and Philip Sherrard. Edited by George Savidis. Revised Edition. Princeton University Press, 1992)

25 agosto 2015

Os errantes
os fugazes viajantes
que nós somos
buscando sempre a vibração perdida
diariamente caem
da árvore da memória
onde brilha o nome
o melancólico ansiado barco

...

E na busca heróica
do instante transfigurado
o activo martírio de prosseguir
faz de nós
eternos estrangeiros mal-amados
desamparados
peregrinos recém-chegados
ana hatherly
rilkeana
assírio & alvim
1999

23 outubro 2012

CARTA A MÁRIO CESARINY NO DIA DA SUA MORTE



Hoje soube-se uma coisa extraordinária,
que morreste. Talvez já to tenham dito,
embora o caso verdadeiramente não
te diga respeito, e seja assunto nossos (sic), vivo.


Algo, de facto, deve ter acontecido
porque nada acontece, a não ser o costume,
amor e estrume; quanto ao resto
tudo prossegue de acordo com o Plano.


Há apenas agora um buraco aqui,
não sei onde, uma espécie de
falta de alguma coisa insolente e amável,
de qualquer modo, aliás, altamente improvável.


Depois, de gato para baixo, mortos
(lembrei-me disto de repente
agora que voltaste malevolamente a ti)
estamos todos. A gente vê-se um dia destes por Aí.



Manuel António Pina

22 setembro 2012

Manuel de Freitas, 2010

para o Rui Miguel Ribeiro


Uma cerveja, uma esplanada, pombas
rondando os magros arbustos
- uma espécie de serenidade, intocável.
Penso como seria diferente este preciso momento
se me tivessem internado durante um mês,
à mercê de exames e de uma firme promessa de morte.

Penso que nunca tive um melanoma, uma cirrose,
uma hérnia no estômago, essas coisas
por que passaram alguns amigos meus.
E lembro-me de uns versos de Emily Dickinson
muito parecidos com a luz forte de Lisboa.

Penso que tenho, afinal,
um inferno pequeno
mas verdadeiro
por ser, como o vosso, mortal.

                       ............

I think how this very moment would be different
had I been admitted to hospital for a month,
at the mercy of tests and a firm promise of death.

I think how I’ve never had a melanoma, cirrhosis,
a stomach hernia, those things
that friends of mine have endured.
And some lines by Emily Dickinson come to mind
very similar to this strong light of Lisbon.
I think how after all I have
a real hell,
though small,
for, like yours, it's deadly.

29 junho 2012



Tudo o que é dado vem fora de tempo.

Não existe outro modo.
Entre o olho e a mão há um abismo,
entre o quero e o posso um afogado.
Um país que mostra sua cabeça disforme
e que se entrega a destempo,
nada é o que esperamos.
E o que chega embrulhado em papel de presente
há-de ir-se manchado de ódio.


Bailamos entre as ruínas dum encontro.
Desenhamos uma chícara de café no deserto.
Vivemos de somar e subtrair,
o que nos dá o amor, o que nos tira o medo.
Dão-nos no fim os ossos dum perfume.


Mesmo assim persistimos.
Em alguma montanha vive um peixe fugidio.
Entre números partidos desliza uma estrela.



Jorge Boccanera


encontrado na Rua das Pretas

23 fevereiro 2011

Parados No Tempo Que Não Pára

Quando a crise cresce
nada cresce.
Quando a crise cresce
meninos e meninas continuam a crescer.

e os senhores da crise andam por aí... e os senhores da crise andam por aí ...

Quando a crise cresce
nada cresce.
quando a crise cresce,
meninos e meninas continuam a crescer.

e os senhores da crise andam por aí ...

nas telenovelas, não há crise:
sexo sem crise, dia após dia.
quando nada cresce,

para a crise, sexo sem crise,
pelo menos nas telenovelas paradas no tempo que não pára.
refresco para os desempredos,
resfresco para os parados na
crise que nao pára num tempo abandonado,
crise para uns, sexo para outros



Frederico Patasca
Porto, 14 de Fevereiro de 2011

27 dezembro 2010

A outra face

Hás-de voltar aqui, hás-de sentir
a estupidez do mundo como um pêndulo
batendo a horas certas
ao ritmo dos dias, das semanas,
dos meses ou dos anos que, sem dares por isso,
hão-de passar velozes até dissolverem
o céu e o inferno e os teus últimos
rastilhos do orgulho. Hás-de aprender
a amar os que te odeiam
e a afogar a tua bilís negra
no caudal desse rio a que chamas
perdão ou esquecimento.

Hás-de voltar aqui, hás-de envergar
essa coroa de espinhos que te assenta
tão bem, hás-de mentir
de novo a essa gente, obedecer
com um sorriso inócuo ao seu tráfico
de pequenos conluios burocráticos,
às rasteiras da inveja, aos mais iníquos
crimes humanos - tudo isso
a que mais tarde alguém há-de chamar
simplesmente injustiça.

Hás-de voltar aqui, hás-de saber
dar-lhes a outra face

Fernando Pinto do Amaral

05 fevereiro 2009

Canto Diurno


No silêncio bebe a sua taça
e é dor o amor enquanto espera,
imagina o desejo de repente
e lentamente olha o olhar do Outro.
Conhecer é amar, disse o divino
Platão ou outro filósofo antigo.
Porém como traçar na sombra
da persiana de luz o esboço
do teu rosto escasso ausente,
se no diurno amor a memória
o faz mais esquecer-se?

Quando Março me dá a nova flor
que abre sem palavras a corola,
eu comparo-a com o amor que eclode
na pupila do olhar em luz e sombra.
Todo o ventre é bendito, tanto
mais o da primavera do cio
de aves e flores. Também o desejo
imaginou a língua sem palavras,
e que é a do som do Canto e dos poemas.

Este diurno Amor está em corpo,
e num e noutro, como o pão partido
no banquete dos convivas silenciosos
que é o de cada um consigo e os outros.
Nenhuma coisa ausente o partilha,
quando as estações do tempo passam
por nós depois da Primavera e param
na longa mesa posta para o Verão.
Tudo é presença aqui, e o tempo é dia.


Fiama Hasse Pais Brandão

22 janeiro 2007

Fiama Hasse Pais Brandão 1938-2007

Tudo o que vivêramos
um dia fundiu-se
com o que estava
a ser vivido.
Não na memória
mas no puro espaço
dos cinco sentidos.
Havíamos estado no mundo,
raso,
um campo vazio de tojo seco.

Depois, alguém
urbanizou o vazio,
e havia casas e habitantes
sobre o tojo. E eu,
que estivera sempre presente,
vi a dupla configuração de um
campo,
ou a sós em silêncio
ou narrando esse meu ver.

De: As Fábulas

17 dezembro 2003

I
Aguarda
há algo que chama
maior que essa chama

são os dias
lestos desabridos
voláteis como o tempo