20 setembro 2006

Ó p'ra ela a dar-nos música!

A Ministra da Educação teve uma ideia. Sim, senhores, soem os tambores! Uma ideia! Levantou-se e desatou a bradar a todos os jornais. Só que se esqueceu de um pequenito pormenor, coisa de nada: ra-cio-ci-nar. Coitadita, uma pessoa também não se pode lembrar de tudo, e ter a ideia já é muito bom!

A ideia da sra. ministra é a de dar aulas de música a todos os meninos do 1º ciclo do ensino básico das 15h30 às 17h30. Dito assim até parece uma boa ideia, e o princípio é corretíssimo: pôr a música como parte integrante dos currículos escolares desde o início.
Falta pôr em prática, e aí é que surgem muitos problemas:
  1. Duas horas por dia daria um horário de 10 horas semanais, se as aulas fossem diárias. Isto não chega a ser um horário de part-time para estudantes de música.
  2. Os estudantes a quem estas horas poderiam interessar têm eles próprios aulas a esta hora da tarde.
  3. Podiam fazer acumulação de horas em várias escolas primárias de um mesmo concelho, prefazendo um horário completo, com um contrato de trabalho dentro da legislação: sim, a ideia é boa, mas cada pessoa não pode estar em dois sítios simultaneamente e os horários são simultâneos.
  4. Os professores que se sujeitarem a este horário e a este salário de 10h (ou menos) semanais, vão, obviamente, sair assim que encontrarem algo melhor.
  5. Precisamos assim de um professor de música para cada escola primária do país. Ora, mesmo tendo em conta que as escolas desaparecem às centenas, e sabendo que não chovem profs. de música... onde é que a ministra acha que se podem encontrar professores de música nesta quantidade industrial?
  6. Delegou a responsabilidade nas câmaras municipais, que estão aflitas, e ela diz com ar cândido: "nós lá no ministério tratámos de tudo, não há razão nenhuma para que não esteja tudo a funcionar nas escolas!"
Legislar assim é fácil! Qualquer um de nós tem um pesadelo de noite e debita leis a toda a velocidade para delegar a responsabilidade do impossível nos outros.

Por isso nós, músicos, que sempre defendemos o ensino da Música a todas as crianças e jovens, e que sempre sonhámos com aulas de Música nas escolas do ensino geral (fora dos conservatórios e escolas similares), vamos continuar com a nossa utopia. E as crianças vão continuar sem poder aceder à leitura de uma partitura, sem poder desfrutar do desenvolvimento cognitivo e emocional que a aprendizagem musical/ artística traz a qualquer pessoa.