O Daniel Oliveira, do Barnabé, disse que é o melhor filme português que viu em muitos anos, acho que ele não viu muitos filmes portugueses nos últimos anos. Eu também não e tenho pena. Não vi o Rasganço, nem o Milagre Segundo Salomé nem o último do Fernando Lopes (lembrando-me de alguns que poderiam ser imperdíveis). Ainda assim Noite Escura de João Canijo, o autor do grande filme que foi Ganhar a Vida, fica a dever um bocado a este e a algumas proposições suas. O filme sacrifica-se ao objecto estético, a maneira como filma é excelente para nos intoduzir na noite e na vida de um bar mas é redutora e aborrecida a partir de certo momento.
Num documentário sobre Henri Cartier-Bresson que passou há pouco n tv ele dizia que, na fotografia (ou na arte) havia os trabalhos demasiado pensados, os conceptuais, os trabalhos demasiado sentidos, os panfletários e os demasiado preocupados com o valor estético da imagem, uma boa imagem devia ser uma mistura equilibrada destes três.
Noite Escura tem uma força avassaladora que se chama Beatriz Batarda. Quem se lembra da jovem assustada/arisca da Caixa de Manoel de Oliveira? A interpretação que faz de Carla, a filha mais velha que controla o bar é, sim, uma das melhores representações do cinema português. Nada ali se sente forçado como no resto das personagens, o Fernando Luís a forçar um linguarejar de chulo, a Rita Blanco a forçar o vernáculo de uma velha prostituta, a adolescente rebelde fez bem em não forçar nada porque assim não somos convidados ao artifício da verdade, ele fica connosco. Beatriz Batarda está melhor que o próprio filme.
Por não sentir em Noite Escura o rasgo de Ganhar a Vida (aí Rita Blanco está bem à altura) não quer dizer que o filme seja mau, sinto que não atingiu os objectivos propostos e que desperdiça aquilo que utiliza como pano de fundo para uma tragédia familiar sem grande consistência ou força.