23 outubro 2007

Curdistão - Sintese Histórica

O mais antigo testemunho de uma cultura unificada entre os povos que habitam as montanhas do Curdistão remonta ao período da cultura Halaf, cerca de 6000 ac. A distribuição dos vasos que identificam este tipo de cultura e o território onde hoje se estabelece a maioria do povo curdo é quase idêntica. “ James Melaart, better known for is escavation of Catal Huyuk, found many of the motifs and composite designs present on Halaf pottery and figurines still extant in textile and decorative designs of the modern Kurds who now inhabit the same excavated Halafian sites.” A unificação deste tipo de cultura ficar-se-á a dever a constantes migrações pressionadas pela forte densidade demográfica, e pelo desenvolvimento de actividades económicas ligadas ao nomadismo, característica das populações entre o Tauro e o Zargos. Cerca de 5300 ac. a cultura de Ubeid expande-se nesta zona e na Mesopotâmia durante cerca de mil anos. É deste período que nascem os nomes das principais cidades sumérias e os nomes dos rios Tigre e Eufrates. Cerca de 4300 ac. os Hurritas chegam a esta região estabelecendo nova hegemonia donde herdam os curdos nova unificação e identidade. “ The fundamental legacy of the Hurrians to the present culture of the Kurds is manifest in the realm of religion, mythology, martial arts, and even genetics. Nearly two-thirds of Kurdish tribal, topological and urban names are also likely of Hurrians origin (...) By the end of the Hurrian period, Kurdistan seems to have been culturally and ethically homogeneized to form a single civilazation wich as such by neighboring cultures and peoples.”
No ano 2000 ac. os povos indo-europeus como os Hititas e os Mitânios chegam ao sudoeste asiático, estes últimos fixam-se no Curdistão Podem ter sido responsáveis pela introdução de tradições do Índico na religião Yasnadista. No entanto é cerca de 1200 ac. que os povos indo-europeus varrem esta zona com maior incidência, nomeadamente os Arménios, os Persas, os Sármatas, etc. Estes povos empurraram os povos das montanhas para o sul do Zargos. “ As early as the 3rd century BC, the Cyrtii ( “Kurti”) are reported by Greek, and later by Roman authors. To inhabit as much the southern ( Persia or Pars/Fars) as the central and northern Zagros ( Kurdistan proper). This was to continue for another millenium, when early Islamic sources also enumerate tens of Kurdish tribes in the southern Zagros (...) While many hypotheses have been advanced to connect the ethnic name “Kurd” to that of the ancient Hurrian Qutils ( Hallo, 1971) or the Khardukhoi ( Carduchoi) of the Greek historian Xenophon ( Cawkell, 1979), none have much merit. Whatever the roots, there is evidence to push the origin of the word “Kurd” back at least to the early 4th millennium BC, if not earlier.”
Os árabes ocupam toda esta área a partir do século sétimo e no século X árabes e curdos vivem conjuntamente. No século seguinte assiste-se à chegada de turcos que se convertem ao islamismo e tornam-se senhores destas regiões. É provável que os curdos tenham sobrevivido a uma assimilação devido ao nomadismo das suas tribos, mesmo assim são muitas que preservam nomes turcos como por exemplo Karachul, Chol, Devalu, Oghaz, são, no entanto os nomes e pouco mais da permanência cultural de turcos Seljucidas No século XVI as guerras entre Persas e Otomanos, tiveram impacto importante na vida de Curdos e Arménios. A partir daqui o Curdistão ficou dividido entre os Safáfidas e o Império Otomano. O nomadismo assume característica plena e indissociável na economia destes povos. Actualmente três quartos dos curdos fala o dialecto dos Kurmanji, a tribo nómada mais recuada a quem se ficou a dever a sobrevivência da cultura curda durante as migrações árabes e turcas, e a quem grande parte dos curdos após a invasão do Império Otomano vai ser obrigado a juntar-se. Com particularismos e adaptações próprias derivadas de múltiplas influências a maior parte dos curdos é hoje, no entanto, muçulmana. Cerca de 75% são membros da corrente sunnita, cerca de quatro milhões são shiitas, principalmente os que vivem no Irão. Os restantes curdos seguem vários cultos ancestrais, o Yezidismo, por exemplo que comporta tradições judaicas, cristãs, islâmicas, zoroastrianas. Embora minoritários os Yezidistas são uma fonte de orgulho, pela tradição que transportam, para curdos de outras religiões.
A princípio o Império Turco-Otomano deixou alguma autonomia aos poderes locais curdos, mas a partir do século XVIII, a perda de poder do Império Otomano obrigou-o a pressionar os territórios em seu poder, quer militar, quer económica ou fiscalmente. Na área de influência que era controlada pelos sheikes do futuro Irão, instituiu-se uma espécie de governo autónomo baseado em dinastias locais de tipo feudal. O Curdistão transformou-se num campo de batalha entre estes dois poderes e manteve-se, desta forma, dividido.
No século XIX a força do Império Otomano está em crescente declínio, com o desenvolvimento do capitalismo na Europa Ocidental e as suas necessidades de domínio sobre outras partes do mundo. Durante este período as necessidade fiscais e económicas recaem sobre a zona do Curdistão com especial violência e intensidade. Verificaram-se rebeliões contra o poder otomano por parte dos poderes locais, apoiadas por famílias que perdiam assim o controle que tinham sobre certas regiões, este poder ia desde a aplicação da justiça, do fisco até ao controle das actividades económicas. Não era assim uma rebelião nacionalista como acontecia na mesma altura em vários pontos da Europa, mas sim uma reacção das elites locais contra a sobreposição de poderes que até aí eram do seu domínio exclusivo. As revoltas foram suprimidas com um aumento significativo do papel regulador do Império Otomano.
Com o desmembramento do Império Otomano após a I Guerra Mundial e o aparecimento de Estados como o Iraque, a Síria, a Palestina , a Transjordânia e o Líbano, o Curdistão vê reconhecida a sua autonomia no Tratado de Sèvres em1920, o mesmo que consagra as novas nacionalidades e reduz o império à Turquia situada no planalto da Anatólia. (Logo em 1921 é assinado o Tratado de Ancara, com a França, que prevê a anexação de larga porção do Curdistão na República da Turquia.) Assiste-se ao fim dos grandes impérios e neste caso ao fim de mil anos de história. O califado turco será abolido a 1 de Novembro de 1922 com a chegada ao poder, através de uma sublevação militar, do nacionalista Mustafá Kemal Ataturk. A Turquia, como aliás outros Estados, recusa-se a aceitar as disposições territoriais dos Tratados do pós-guerra, e não rectifica o Tratado de Sèvres. Em 1923 é assinado o Tratado de Lausanne ( pela Turquia, França, Itália, Grécia, Roménia, Jugoslávia e Inglaterra com papel primordial) que substitui o anterior e em que as potências europeias reconhecem a Turquia como uma nação soberana, que não é obrigada, desta forma, a conferir o estatuto de independência aos curdos. O mesmo Tratado obriga a que a Turquia garanta, no entanto, a defesa e o respeito pelas minorias do seu país. Hoje, os curdos não são reconhecidos oficialmente como grupo minoritário naquele país.
(...)
Josina Almeida, O Nacionalismo Curdo à luz de Hobsbawm- História dos Nacionalismos, FLUL, 1998
[1] Izady, Mehrdad R., “Exploring Kurdish Origins”, in Kurdish Life, nº 7, 1993.
[2] Ibidem.
[3] Ibidem.

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