21 outubro 2007

Acção Directa




Quem acredita que vivemos no melhor dos mundos possíveis e que tudo está escrito dispensa qualquer reflexão sobre acções de luta que fogem do quadro legal em vigor. Manifestemo-nos com autorização do governador civil à hora certa, respeitemos os espaços destinados à manif. por trás das grades separadoras, respeitemos os metros de segurança entre nós e o ministério, entre nós e residência do PM, entre nós e a autoridade, para podermos fazer parte comum no quadro democrático. Não ficamos tão bem na fotografia? Podemos afagar a consciência e sem ter de entrar numa igreja.

Mas quem nos vai ouvir se partirmos uma montra?
E quem nos ouve se não a partirmos?

Quem acredita que o quadro democrático está longe de corresponder à realidade que a palavra/conceito enuncia/define então tem, talvez desde sempre mas especialmente agora, toda a legitimidade para tomar a realidade nas mãos e questioná-la/afrontá-la. É possível fazê-lo dentro das regras? As regras não são as de todos, nunca poderiam sê-lo.
No último ano dois acontecimentos marcaram a luta anti-capitalista no nosso país. Marcaram pela diferença, e pelas reacções. A dimensão e a forma destas reacções são aliás, quanto a mim, a forma como podemos avaliar o poder, real ou imanente, que estas acções tomaram. A manif. anti-fascismo no dia 25 de Abril que correu ruas e montras com sprays e a manif. no milheiral do Algarve. A polícia correu, na sua forma mais covarde e brutal, à bastonada os primeiros manifestantes com a quase ausência de actores políticos a tomarem posição. Veja-se o discurso do PCP no encontro parlamentar pós comemorações que versou as suas preocupações sobre a forma como Cavaco Silva entendeu apelar à renovação das comemorações de Abril. E veja-se também como nada disse o Bloco de Esquerda sobre manifestantes que na rua foram barbaramente agredidos por estarem, justamente, a atacar os fundamentos da sacrossanta propriedade. A violência da polícia é inversamente significativa do silêncio dos partidos que se reclamam da necessidade da alteração radical do estado de coisas. Bloco de Esquerda que, alguns meses mais tarde, volta a meter mãos pelos pés quando foi preciso vir a terreno apoiar os ecologistas que numa acção directa se apropriaram da política. O frenesim na imprensa pós declamações de Pacheco Pereira e a dimensão que tomou só nos pode dar conta, irremediavelmente, que em Silves se tocou no sítio certo.

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