10 janeiro 2013

O mínimo decoro

Ora quem se coloca fora da lei está a pedir um tratamento fora da lei. Mas eles não estão apenas a pedir pedradas. Estão a pedir o confisco dos seus relvados, dos seus automóveis, das suas casas, das suas piscinas, dos seus valores mobiliários, dos seus quadros, dos seus cavalos, das suas jóias e luxos e a supressão de todas as mordomias. Não que isso seja economicamente relevante. Mas significa a reposição de um mínimo de decoro.

Ser-lhes-á então tarde para perceber que numa situação de ruptura a própria polícia mudará de campo. Certos jornalistas descobrirão escrúpulos éticos insuspeitados. Economistas e contabilistas virão dizer que foram mal interpretados e nunca proferiram aquelas coisas. Irromperão múltiplos vira-casacas e desertores da tirania de mercado, dispostos a pisar a livralhada de Milton Friedman e a cuspir no retrato emoldurado da Senhora Thatcher.
E lá terão as pessoas de bom senso de arriscar a reputação e a pele para evitar que se maltratem umas dúzias de plutocratas amedrontados e seus serviçais de fatinho, rojados pelo chão, de folha de cálculo à mostra.
Mário de Carvalho,Avé Portugal Mendigo, Senhora da Linha em Maré de Pobres 20.12.12

08 janeiro 2013

Paulo Rocha 1935-2012

"Ele havia Salazares, a Pide era mesmo ao lado do S.Luiz, a censura não estava longe, mas aquele dia rasgado, puro e limpo, o dia sob a ditadura em que vi os Verdes Anos.

E a rapariga, Ilda, arranca a camisola das mãos de Júlio, o rapaz, ele olha para ela e sabe que a perdeu, ela quebrou uma unha, a mão leva-a à boca, estão num baldio sobranceiro à cidade moderna, deveria ouvir-se ao longe o som das obras, não fosse esse dia domingo e dia de passeio das criadas de servir e dos rapazes de outras terras, em Lisboa por causa do tio ou de um padrinho, choveu, há poças de água, o céu está cinzento, o ar lavado depois da chuva, a guitarra não pára, às voltas e às voltas, voltas de amor perdido, voltas de peito à vida feito, de cabeça erguida, da valentia, cordas tensas da guitarra arrancadas até ao sabugo, sem parar, Carlos Paredes à guitarra, Nuno Bragança ao argumento, Pedro Tamen nos versos, Cunha Telles na produçã, gente cujo nome decorei, acabei por conhecer, ou com eles trabalhar, como o Paulo Rocha, o rapaz tímido e intenso, teimoso e vibrátil, sereno e cultíssimo, que passou a ser nosso, tão nosso neste filme para sempre nosso."

Jorge Silva Melo, Paulo Rocha: Verdes Anos, filme da minha vida in Século Passado, Cotovia, 2007

03 janeiro 2013

Melhores filmes vistos em 2012


 



                                              
 

        



 


 
Foram poucos flmes que o ano me trouxe ou me deixou ver. Esta é a pequena selecção, nenhum é deste ano e o filme do Desassossego tem de entrar apesar da ópera do Carrapatoso, apesar do final tão explicadinho.